top of page

O fim da guerra é o começo

 

Isadora Stentzler

 

Ex-diretor de redação da revista Superinteressante, o jornalista brasileiro Denis Russo Burgierman escreveu em 2011 o livro reportagem O fim da guerra, que lhe rendeu o prêmio internacional de jornalismo Knight Fewllowship. A obra aborda a luta contra as drogas com argumentos políticos, sociológicos e econômicos e enfatiza a importância de um novo sistema para lidar com o assunto, principalmente no que diz respeito à maconha. Para esta avaliação, Burgierman percorreu cinco países que já afrouxaram as políticas sobre drogas e ainda visitou as fronteiras e famílias afetadas pelo comércio ilegal.

 

O pressuposto que move a teologia de Burgierman é de que lidar com drogas é lidar com problemas complexos. Para tanto, soluções simples seriam incabíveis tornando a atual forma de repressão às drogas inviável. Nesse sentido, a forma simples e brusca age como um balão quando pressionado em uma extremidade. A pressão faz com que o ar inflame do outro, sem, contudo, esvaziar a bexiga. Para Burgierman, processo semelhante ocorre com as políticas antidrogas, uma vez que tomadas pelo moralismo proibicionista, fazem com que a bomba estoure do outro lado: o do tráfico.

 

Compara-se isso com a medida antiálcool adotada pelos Estados Unidos na década de 1920. Com a venda proibida pelo Estado e o despejo de litros de álcool nos bueiros, empreendedores criaram bares às escuras que forneciam bebidas ilegalmente. Sem controle e fiscalização, a situação causou caos na saúde pública, aumentando, inclusive, o número de mortos por intoxicação alcoólica. Em nome da temperança e dos bons costumes, a política da Lei Seca matou mais gente que a destemperança, uma vez que as pessoas já usufruíam de bebidas e a brusca proibição só piorou o estado. A lei só foi mudada em 1933.

 

Mais tarde a mesma política ganhou coro nos sistemas antidrogas adotados pelos presidentes Richard Nixon, em 1970, e Ronald Reagan, em 1980. O que eles fizeram para apertar a bexiga foi colocar todas as drogas na mesma medida, tanto as pesadas quanto as leves, e as proibir.

 

Assim, passou-se a vender a imagem da maconha como uma malfeitora na mesma medida que a heroína e a cocaína, por exemplo. Enquanto isso laranjas de traficantes são presos abarrotando as cadeias e crianças são cada vez mais inclusas no tráfico, por serem de menor e não serem punidas quando capturadas com a droga.

 

Burgierman, apesar de rejeitar esse sistema que ainda vigora em bora parte do mundo, reconhece na obra que é apenas com o sistema que se chegará a uma solução. No entanto, é preciso lidar com o problema de maneira gradual, racional e moderada.

 

Outros déficits apontados pelo autor que não estão contemplados na política antidrogas é o preconceito racial, que ainda pune mais negros do que brancos nesse mercado, a corrupção policial, já que a gentes a serviço da segurança também aderem ao tráfico, a pesquisa científica, que não pode avançar porque o uso da maconha é ilegal até mesmo para estes fins, investimento do dinheiro público em armamento e prisões, em vez de o usar para universidades e etc.

 

Já dos lugares cujas leis sobre drogas foram afrouxadas como Holanda, Portugal, Marrocos, Califórnia e Espanha, Burgierman se deteve a conhecer a política empiricamente e ressaltear os prós e contras da aderência ao sistema.

 

A obra do jornalista é uma carta aberta e demagógica contra os tabus construídos ao longo dos anos de proibicionismo ferrenho. A leitura eleva o leitor para um universo unilateral e, apesar de entender que o próprio autor é pró cannabis, a conclusão fica para o leitor.  

  
bottom of page