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Estado de Direito brasileiro é levado à descrença

 

Juliana Dorneles e Daniela Fernandes

 

O Brasil vive hoje uma crise política e econômica, resultado de um histórico de escândalos e corrupções. Essas consequências atingem o povo, a estrutura do país e, também, a imagem do Brasil no exterior. Para explicar o assunto, o Canal da Imprensa conversou com o doutor em Direito do Estado e promotor de Justiça aposentado do Ministério Público do Estado de São Paulo, José Antônio Remédio. 

 

 

Canal da Imprensa: Há 10 anos atrás presenciamos o Escândalo do Mensalão e, hoje, vivemos o Escândalo da Lava-Jato. O Brasil sofreu os efeitos do Mensalão. Você acha que as consequências da Lava-Jato serão maiores?

 

José Antônio Remédio: Sem dúvida, os efeitos da Lava Jato serão maiores que os do Mensalão (AP 470), e bem maiores. O Mensalão (AP 470), embora envolvesse parte da cúpula política do país, não teve valores monetários tão expressivos (R$170 milhões). A Lava-Jato, além de envolver parcela expressiva de políticos do país (inclusive os presidentes da Câmara e do Senado), grandes empresas (Mendes Júnior, Camargo Corrêa e Odebrecht), a maior empresa do País como lesada (a Petrobrás), também envolve valores que ultrapassam a cifra dos R$4 bilhões causado pela corrupção na Petrobrás (só o MP suíço bloqueou R$1,3 bilhão em contas investigadas).

 

CI: Na sua opinião, como ficará a imagem do Brasil, internacionalmente falando, após os dois escândalos?

 

Remédio: No âmbito internacional, o Brasil, de alguma forma, já tinha conseguido superar os efeitos do Mensalão, inclusive pelo fato de ter havido a condenação de diversos agentes políticos envolvidos no escândalo, muitos dos quais, inclusive, estão cumprindo pena. A Lava-Jato, no entanto, traz inúmeros problemas em nível internacional, inclusive a falta de credibilidade do país para efeito de aplicação de recursos financeiros estrangeiros. A nota do Brasil foi reduzida pelas agências de riscos internacionais, o que implica em maior dificuldade de se obter recursos. Isso acarreta dificuldades para a economia.

 

CI: Além das questões políticas e econômicas, que outras implicações esses escândalos acarretam para a população brasileira?

 

Remédio: Os escândalos, caso não investigados e punidos os infratores, podem levar o povo à descrença no próprio Estado de Direito brasileiro, ou seja, passa-se a ideia de inexistência de um Estado com instrumentos e credibilidade para buscar o bem comum do povo, finalidade essa que incumbe no caso do Estado brasileiro.

 

CI: É possível ter esperança já que alguns empresários e políticos foram presos por corrupção? Ou a Justiça do Brasil é algo utópico?

Remédio: Não só é possível, como é necessário que haja crença nas instituições incumbidas do controle da atividade estatal. A esperança não pode decorrer apenas do fato de alguns políticos e empresários terem sido presos em face dos escândalos do Mensalão e da Lava Jato, mas sim, em razão da crença em que as instituições de Estado, entre as quais o Ministério Público, a Polícia Federal e o próprio Poder Judiciário, estão aparelhados para exercer o combate à corrupção.

 

CI: As diversas manifestações indicam que parte dos brasileiros estão frustrados com a economia e com a política do seu país. Na sua análise, qual é o principal motivo para essa insatisfação?

 

Remédio: Sem dúvida, entre os principais motivos para as diversas manifestações dos brasileiros estão a corrupção, de um lado, e a crise econômica (que implica no aumento do custo de vida, dificuldades para encontrar ou manter o emprego, saúde e educação precárias), e isso tudo sem que o governo apresente um caminho plausível para a superação dos problemas.

 

CI: Como o senhor vê a situação da presidente Dilma? Ao seu ver, como ela tem reagido?

 

Remédio: Vejo a situação da presidente Dilma como bastante delicada. De um lado, políticos bastante próximos a ela, inclusive do Partido dos Trabalhadores (PT), seu partido político, envolvidos em escândalos de corrupção. De outro lado, a presidente, além de não admitir claramente a participação dos agentes políticos nos eventos sob investigação, ainda não formula uma política suficientemente clara para o desenvolvimento econômico e o combater à corrupção.

 

CI: Há evidências que legitimem o impeachment?

 

Remédio: Sob minha ótica, ao menos até o momento não há evidências que legitimem o impeachment da presidente Dilma. O impeachment da presidente somente é admissível nos casos de crimes de responsabilidade previstos no art. 85 da Constituição Federal, que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra “a probidade na administração”. Embora os atos de corrupção da Lava-Jato impliquem em improbidade administrativa, até o momento não há indícios ou evidências no sentido de que a presidente tenha participado direta ou indiretamente de tais atos. 

    
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