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"Efeito borboleta"

 

Thamires Mattos

 

Acordamos, tomamos café, falamos mal da política brasileira, almoçamos. Encontramos um jeito de tentar argumentar porque deveríamos ter nascido em terras europeias ou norteamericanas. Jantamos pão com bife. Assistimos o jornal, conversamos mais um pouco sobre a podridão parlamentar de nosso país e vamos dormir. No outro dia, a história se repete. Mas nos esquecemos que a política ruim faz parte de um cenário global e interligado, ou seja, não é só o Brasil que sofre com tudo isso.

 

O filme Syriana – A indústria do petróleo, dirigido por Stephen Gaghan, é uma adaptação livre de See no evil: the true story of a foot soldier in the CIA’s war on terrorism (Não veja o mal: A história real de um soldado de infantaria na guerra da CIA contra o terrorismo), livro de memórias do operativo de baixo escalão da CIA, Robert Baer.

 

O filme não tem apenas um protagonista. A história de cinco homens se liga por circunstâncias vindas de fora. Bob Barnes (George Clooney), agente da CIA com experiência no Oriente Médio, não é nenhum santo. Para fazer seu trabalho, ele se envolve com terroristas e suborna civis. Apesar disso, há mais no mundo do que ele imagina – as intenções dos Estados Unidos são diferentes das dele. Já o advogado Bennett Holiday (Jeffrey Wright) investiga o esquema de corrupção em uma companhia petrolífera. Enquanto isso, o técnico de uma consultoria suíça especializada em fontes de energia, Bryan Woodman (Matt Damon), começa a trabalhar com o possível herdeiro de uma nação árabe cheia de petróleo, o Príncipe Nasir Al-Subaai (Alexander Siddig). Aparentemente longe de todas essas histórias, está o jovem paquistanês que acabou de perder o emprego, junto com o pai, em uma refinaria - Wasim Khan (Mazhar Munir). Sem muita ligação com o islamismo, ele vai parar em uma “escola islâmica” para poder ter o que comer.

 

A crítica a sistemas políticos manipuladores e corruptos é encontrada de maneira intensa no filme. Para um dos líderes da escola islâmica onde Khan estava, Farooq, “o capitalismo não pode existir sem desperdício” – esse pensamento do radical religioso está na boca de muita gente. Se para Farooq a raiz do sistema capitalista é o desperdício, para o americano Danny Dalton, advogado, é a corrupção. Em uma conversa para desencorajar o trabalho de Bennett Holiday, ele afirma em tom de normalidade que “corrupção é a intromissão do governo nas eficiências do mercado em forma de regulamentação. Corrupção é a nossa proteção. Ela nos mantém seguros e cômodos (...). Ela nos permite ganhar”. Nesse discurso sem ética, é revelado o problema moral por trás de todas as intrigas do filme. A busca incessante e prioritária pelo dinheiro e poder leva pessoas comuns a se tornarem monstros corporativos. A falta de crença em ideais mais nobres faz com que na primeira oportunidade de “subir na vida”, tudo seja feito ao nosso favor. Países podem ser destruídos aos poucos e o futuro de muitos inocentes será incerto, mas ninguém liga para isso se tiver a conta “recheada”.

 

A verdade é que pequenos atos de corrupção são cometidos por todos nós a cada dia. Syriana mostra que em proporções maiores ou menores, as consequências virão em um efeito borboleta – e nem sempre o mocinho terá um final feliz. Mas, será que existe mocinho? Para o chefe de Holiday, Dean Whiting, “você é inocente até que seja investigado”. 

  
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