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Democracia eletrônica

 

Luiz Gustavo Santos e Emanoel Junior

 

Diego Aranha é Bacharel em Ciência da Computação pela Universidade de Brasília (2005), Mestre (2007) e Doutor (2011) em Ciência da Computação pela Universidade Estadual de Campinas. Em 2014, criou o aplicativo Você Fiscal, que reuniria fotos de Boletins de Urnas e fiscalizaria o resultado divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O aplicativo está disponível para qualquer eleitor que possua um aparelho com o sistema operacional Android.

 

Em 2012, a equipe coordenada pelo professor Diego Aranha, então na UnB, venceu os testes públicos organizados pelo próprio TSE, revelando falhas que permitem revelar quem votou em quem e, pior, alterar o resultado das eleições.

 

Canal da Imprensa: Diego, o aplicativo “Você Fiscal” propõe uma forma alternativa de contagem dos votos. Explica como se dá esse processo?

 

Diego Aranha: O Você Fiscal é um aplicativo Android para fiscalizar a etapa final da eleição, o processo chamado totalização, que envolve a soma dos resultados parciais produzidos por urnas eletrônicas em todo o país. Utilizando o aplicativo, o eleitor deverá capturar fotos do Boletim de Urna (BU) do seu local de votação, uma espécie de recibo emitido pelas urnas eletrônicas que contém os totais de cada candidato. Poderemos comparar a informação extraída dessas fotos com os Boletins de Urna eletrônicos publicados pelo TSE alguns dias após o resultado. Desta forma, ficam evidentes possíveis erros ou fraudes na transmissão dos BUs para os servidores do TSE.

 

C.I: A proposta de fotografar parece válida. Mas existe a possibilidade de o Boletim de Urnas já sair alterado às 17 horas?

 

Aranha: O Boletim de Urna será compatível com a intenção dos eleitores se o software instalado nas urnas se comportar de maneira honesta durante toda a votação. Infelizmente, adotamos no Brasil um modelo de máquina de votar que não permite verificar se o software registra corretamente o voto do eleitor, então resta essa limitação intrínseca. O cenário se torna mais preocupante quando são consideradas as vulnerabilidades detectadas no software durante os testes públicos de 2012. 

 

C.I: No vídeo de apresentação, você sugere que o código das urnas seja público para que elas sejam auditadas e reguladas pela população. Como isso aconteceria?

 

Aranha: O TSE poderia eliminar as restrições para exame do código-fonte, que atualmente exigem assinatura de termo de sigilo ou indicação formal por parte de partidos políticos. Vale observar que, apesar de desejável, ainda não é suficiente, pois continua muito difícil determinar se o software utilizado nas eleições corresponde à versão publicada para auditoria. A abertura do código teria impacto maior na qualidade dos mecanismos de segurança implementados, pois a possibilidade de auditoria terminaria forçando a equipe de desenvolvimento a tomar melhores decisões de projeto.

 

C.I: Após o primeiro turno da eleição, como foram os resultados do Você Fiscal? Você acha que essa moda pega?

 

Aranha: Recebemos um volume de dados muito maior do que o esperado, fotografias de mais de 15 mil Boletins de Urna. Estamos processando o volume de dados recebido e ansiosos para observar a receptividade da idéia no segundo turno.

 

C.I: Você precisou de alguma autorização do TSE para criar o aplicativo? Como isso se deu, de forma legal?

 

Aranha: Não precisamos de qualquer autorização, já que nossa fiscalização se baseia em documentos públicos.

 

C.I: Em sua opinião, quais interesses permeiam as falhas nas urnas brasileiras?

 

Aranha: Durante os Testes Públicos de Segurança de 2012, encontramos uma vulnerabilidade que nos permitiu derrotar o único mecanismo de segurança implementado na software da urna para proteção do sigilo do voto. Utilizando essa vulnerabilidade, minha equipe conseguiu recuperar a lista ordenada dos votos em eleições simuladas com até 475 eleitores a partir unicamente de informação pública, com impacto potencial até em eleições passadas. De posse da lista ordenada de eleitores, seria possível determinar com certeza matemática as escolhas de cada eleitor. Essa vulnerabilidade permitia ainda determinar com exatidão a escolha de alguns eleitores ilustres que votaram em instantes de tempo específicos. Além disso, detectamos outras fragilidades que abrem a possibilidade de adulteração ou substituição do software de votação por uma versão que conta os votos de forma desonesta. Todas as urnas eletrônicas do país compartilham segredo que protege os seus dados mais críticos e esta chave está ainda disponível na porção desprotegida dos cartões de memória. Mesmo que corrigidas pontualmente, este conjunto de vulnerabilidades denuncia um processo de projeto e desenvolvimento de software defeituoso, incapaz de detectar trechos de código inseguros inseridos no software por acidente ou sabotagem, e que descarta completamente a possibilidade de fraude promovida por agentes internos.

 

C.I: Você acredita que esse tipo de alternativa é o futuro para aprimorarmos as práticas democráticas?

 

Aranha: Utilizar tecnologia para aprimorar mecanismos de transparência governamental já é tendência há alguns anos, basta observar o número de projetos associados ao tema sendo desenvolvidos pela sociedade. Nossa contribuição aqui é tentar utilizar tecnologia para fiscalizar os resultados de eleição, mesmo que apenas para uma amostra.

 

    
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