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Quem perde a aura é o espectador

 

Mariana Farinha e Nathália Lima

 

A arte, em toda sua magnitude, é dotada de conotações e significados únicos. Por ser personalizada e resultante de "devaneios" do artista, é opaca. Pode levantar vários questionamentos, levar o espectador à diversas conclusões. Isto tudo constitui a aura, a alma, o "eu" da arte. No entanto, em um mundo cibercultural, a comercialização das artes (faz-se referência a todo tipo de manifestação artística) pode interferir em seus verdadeiros sentidos. No fim, esta perde sua aura? Sobre o assunto, o Canal da Imprensa conversou com o Martin Kuhn. Ele é doutor em Comunicação Social e coordenador dos cursos de Publicidade e Propaganda e Radio e TVi do Unasp.  

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Canal da Imprensa: Você acredita no Walter Benjamin diz, quando afirma que a reprodução indiscriminada da arte provoca a perda de sua aura? 

 

Martin Kuhn: Eu acredito que muitas pessoas conhecerem uma obra de arte não diminui seu valor. Todo mundo tem ideia do rosto da Monalisa, todo mundo sabe quem foi Leonardo Da Vinci. Mas o que distingue uma arte é seu valor técnico, seu espírito, a capacidade que o artista tem em reproduzir mensagens através de suas obras, não a quantidade de veiculação da arte. 

 

C.I: Essa massificação, na sua opinião, democratiza a arte ou vulgariza o “artístico”? 

 

Kuhn: Eu acho que existe uma confusão em relação a isso, porque a popularização e a facilidade de comunicabilidade não vulgarizaram a arte, vulgarizaram a "falsa" arte, as aberrações. Eu pego uma obra e distorço, brinco com o rosto de alguém. Isto tem peso de se multiplicar nas redes sociais hoje. Se você tentar preservar o valor que a arte tem, mantendo-a como foi feita com seus atributos naturais, não há problema. O grande problema é que se vulgariza a distorção da arte e se populariza aquilo que não é arte. 

 

C.I: A arte como mercadoria, submetida às regras da indústria cultural perde seu poder como instrumento de comunicação, de transformação social?

 

Kuhn: Não sei se deveríamos ir tão longe. Eu acho que a arte tem um valor social e tem um direito de fazer parte dos negócios, de ser incorporada no dia a dia da gente através de utilização nas mercadorias dos produtos de consumo. Para mim, um dos problemas recorrentes acontece quando você quer, através do mercado, determinar que uma arte tenha valor. Se eu pego, por exemplo, um determinado cantor, reconhecido por sua crença em um mundo justo e o contrado para defender a ideologia de um partido que não é tão "justo" assim, aí o artista e suas obras perdem sua aura. E isto é algo perigoso. 

 

C.I: Em que medida a publicidade define o que é cultura? O que é ser aculturado? O que é digno de ser consumido culturalmente? 

 

Kuhn: Bem, a publicidade e o marketing acabam dando valor a certas coisas e a certos conhecimentos porque entram no mainstream (vulgo, fluxo importante) das redes. O grande problema talvez seja dar valor a certas coisas que estão em pauta no mercado e esquecer outras. O que é importante na cultura? É falar bem a sua própria língua ou conhecer aquilo que é feito em outro país? Talvez seja mais importante falar bem a própria língua, mas a gente acha mais interessante estar "ligado" às coisas que do mundo. 

O não ser culto é relacionado a não ter cultura. Ser culto é ser elegante, falar bem o próprio idioma, respeitar o próximo, ser pontual. Mas às vezes achamos que ser culto é conhecer vários países, falar vários idiomas. 

 

C.I: O consumo exacerbado, característica desta sociedade pós-moderna, confinou o valor da arte apenas a status social? 

 

Kuhn: Não sei se a limitou a isto, mas que supervalorizou neste sentido, sim. A gente pensa na arte como status, pois é o símbolo do raro, a marca do raro. É mais importante porque poucos têm acesso. Confere um valor único.

 

C.I: O acesso desenfreado, a facilidade com que o homem pode acessar arte nestes tempos tecnológicos, aliena, mata a sensibilidade? Torna o consumidor de bens culturais alguém passivo?

 

Kuhn: Um dos problemas desta era é o ritmo alucinado da existência. Toda pressa é inimiga da contemplação, da reflexão. Então, esse ritmo acelerado, essa pressa é inimiga da compreensão da arte. Logo, é possível que a gente esteja se beneficiando menos, entendendo menos de arte não porque elas estejam ao alcance de todos, mas muito mais porque parece que a gente não está mais em condições de usufruir dela. A arte requer atenção de quem a desfruta.

 

    
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