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Cultura não se vende!

 

Nathália Lima

 

Inspirado no livro de Ariano Suassuna, o filme “O auto da compadecida”, dirigido por Guel Arraes, relata a história de Chicó e João Grilo, dois amigos que se metem juntos em várias confusões. O “suplício” começa quando os dois nordestinos tentam convencer o padre da paróquia a benzer o cachorro de sua patroa, a mulher do padeiro. Este se recusa. O cão morre. Depois disto, convencem o padre a enterrar o bichano, mas o bispo fica completamente irritado ao saber da história.

 

A bagunça não para. Moedas são colocadas dentro de um gato, gaitas que “ressuscitam” são dadas de presente aos amigos e todo o resto do pessoal envolvido na história é morto pelo cangaceiro Severino (o tal moço que deu a gaita abençoada pelo padroeiro padre Cícero de presente a João Grilo).

 

João Grilo, depois de muita confusão, leva um tiro e encontra todos que morreram no juízo final. Depois de promessas serem feitas para nossa senhora Aparecida (por ambos os amigos), a situação se restabelece. Ao voltar à vida, João Grilo faz planos com Chicó em relação ao dinheiro do funeral, mas Chicó já havia prometido que, se seu amigo voltasse à vida, a grana seria doada integralmente para a paróquia. Depois de muita relutância, a promessa foi cumprida e a vida dos dois voltou ao usual.

 

Esta é a história que todo mundo conhece, mas o que muitos não entendem é o papel social impregnado nela. A obra se passa no sertão nordestino, onde as crenças em santos, a entrega do povo à religião é uma das partes culturais mais bem fundadas. O filme, partindo do pressuposto que tenha poder sobre o público, acaba massificando esta realidade local. O próprio autor da história é um amante da cultura nordestina. Natural de João Pessoa, Paraíba, usava suas obras para defender e disseminar esta cultura.

 

A massificação do autoral acontece ainda hoje. Existem pontos positivos e pontos negativos em transformar uma obra autoral em algo que “todo mundo pode ter em casa”. Um dos pontos que pode ser definido como positivo é o alcance da arte. Uma vez que esta é conhecida por muita gente, seu valor aumenta. Sua visibilidade ganha grandes proporções, no entanto, a visão ligada à obra pode se deturpar. E o ponto negativo que está completamente ligado a isto é que, a partir do momento que algo se torna público, seu real sentido tende a se perder. Sua aura acaba sumindo. A ideia inicial do autor, do pintor, do artista pode se confundir com diversos outros fatores, talvez por causa de interesses financeiros. Assim, a arte acaba se tornando moeda de troca. E isto nada tem a ver com um dos significados da arte que é protesto e crítica social. O propósito da arte não é vender, mas passar mensagens infinitas.

 

Voltando ao assunto inicial, não se pode negar que o filme “O auto da compadecida” - assim como outros tipos de arte - trouxe ao Brasil um conhecimento diferenciado sobre os costumes, as prioridades e as crenças do nordeste do país. Porém, é necessário prestar atenção nos detalhes e não se deixar enganar por algo superficial. Só quem está aderido à cultura poderá explicar e aplicar o que se quer passar pelo projeto artístico.  

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