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Um legado inconformista

 

Estudiosos se questionaram sobre a solidez da “filosofia hippie”, mas seus valores estavam mais que vivos na mente da sociedade pós-guerra

 

Thamires Mattos

 

Quem nunca se sentiu inconformado com o sistema ou a sociedade em geral? Para muitos, isso é um “estado permanente de espírito” – algo intrínseco e intenso. Durante a Guerra do Vietnã (1954-1975), várias pessoas estavam inconformadas. Elas, então, resolveram começar um movimento de contracultura que se opunha a qualquer tipo de discriminação – social, cultural ou física – e propuseram um estilo de vida em que a paz e o amor pudessem ser disseminados. Nasce aí o movimento hippie. Kombis, dreads, o festival de Woodstock, e artistas como Janis Joplin, Jimmy Hendrix, Caetano Veloso e Gilberto Gil são ícones dessa “tribo” que, mais que um grupo de pessoas, representa a vontade de mudar.

 

Os hippies são grandes defensores da natureza, à sua maneira. Adeptos da sustentabilidade vivem, na maior parte dos casos, com o lucro retirado da venda de artesanatos ou de outro tipo de arte. O “desapego” também faz parte da filosofia: ao colocar a mochila nas costas e viajar com sua comunidade, um hippie deixa tudo o que tinha antes para trás.

 

No fim da Guerra do Vietnã, muitas “sociedades alternativas” foram desmontadas, afinal, o evento que levou à criação do movimento havia acabado. Estudiosos se questionaram sobre a solidez da “filosofia hippie”, mas, não muito tempo depois, movimentos ecológicos em defesa dos direitos da mulher, animais, afrodescendentes, homossexuais e menos favorecidos se disseminaram. Os valores hippies estavam mais que vivos na mente da sociedade pós-guerra.

 

Hoje não é diferente. Apesar de comunidades hippies ainda existirem isoladas do resto da sociedade, não estão em nosso “menu” de assuntos principais para discussão. Entretanto, as mudanças climáticas, ecossustentabilidade, o feminismo “moderno” e a quebra de preconceitos estão na ponta da língua. E, já que a voz do povo forma as pautas da mídia (assim deveria ser, pelo menos), não é difícil ver capas de jornais com o meio ambiente em foco, manchetes de noticiários em rádios/programas de tv sobre a comunidade LGBT e portais de notícias, que, ao invés de pregar a mulher do século 18, valorizam os direitos da atual. O foco dos meios de comunicação pode não ser o movimento hippie em si, mas suas ideias estão muito presentes. Portais como o Catraca Livre e o Hypeness são grandes expoentes dessa tendência.

 

Infelizmente, nem tudo é um mar de rosas. Os valores hippies se opõem ao capitalismo – consequência dele é a massificação cultural. A moda trouxe tendências hippies para o guarda-roupa de milhões de pessoas, transformando uma luta por igualdade, amor e paz em um simples pedaço de tecido costurado por máquinas e vendido a preço de ouro em alguma loja de grife. Revistas adolescentes, como a Capricho e a TodaTeen, aplaudem esse tipo de comportamento, criando uma multidão de meninas (e meninos) fúteis. O tipo de geração que faz o sinal de “Paz e Amor” sem saber o que ele realmente significa, ou, pelo menos, por que grupo foi criado é um exemplo. Por isso, me questiono: será que se uma guerra começasse hoje, essa (que é a minha) geração teria a coragem de impor valores divergentes, ou se esquivaria de todas as discussões? Só sei de uma coisa: contracultura é protesto, não cult.

 

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