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Mera (nada) coincidência

 

Nathália Lima

 

Em um mundo onde tudo é pautado, somos apenas telespectadores, comentaristas e passivos da notícia. Histórias de alto interesse do público, por diversas vezes, não são abordadas da maneira que merecem por veículos importantes de comunicação do país. Não somos os inventores da notícia, muito menos aqueles que escolhem sobre o que falar ou o que assistir. O filme Mera coincidência (1997) retrata de maneira direta esta jogatina entre comunicante e comunicado.

 

Às vésperas das eleições, o atual presidente dos Estados Unidos, que tentava reeleição, se envolveu em um escândalo sexual com uma menor de idade. Sua equipe, interessada na reeleição, armou um plano para mudar o foco dos comentários do país e manter as intenções de votos no candidato. Assim, forjaram uma guerra contra a Albânia e inventaram uma grande história para fazer com que o povo não prestasse atenção no escândalo, mas sim no que estava acontecendo de arriscado ao país.

 

Esse “conto do vigário” funcionou. Durante 11 dias (o tempo que faltava para as eleições) o público teve sua atenção desviada e caiu no golpe, reelegendo assim o mesmo homem à presidência.

 

Um estudo realizado por Maxwell McCombs e Donald Shaw desvendou os mistérios de veículos de comunicação que utilizavam dessa conduta mostrada no filme para fins lucrativos. A Teoria do Agendamento (Agenda Setting), de acordo com eles, acontece quando os meios de comunicação ditam quais assuntos devem ser discutidos pelo público, ou seja, agendam e passam para o espectador o que querem e rende mais. Desta maneira, quem está do lado de cá da telinha não se sente usado ou enganado, pois tudo é fadado de imparcialidade, com a segurança de se chegar às “próprias” conclusões. Com este poder de “peneirar” as notícias mais rentáveis, veículos de comunicação pautam discussões sociais e até “ajudam” o público a tomar determinadas decisões. Dessa maneira, dominam as massas.

 

Um exemplo recente de interferência da televisão nas decisões do público é o comentário sensacionalista feito pela jornalista Rachel Sheherazade. Ao concordar com o espancamento de um rapaz que tentara assaltar um estabelecimento comercial, Sheherazade influenciou pessoas a tomar a mesma decisão e partir para a agressão contra os “marginaizinhos”. Outros rapazes também foram espancados e amarrados em postes. Pode-se perceber que o comentário feito no jornal foi tão influente que “legitimou” pessoas a tomarem decisões desastrosas a ponto de agredirem outros seres humanos. O que prova que o agenda setting é real, e não cena de filme. Assim, é possível perceber quando um veículo de comunicação está (ou não) eufemisando determinado assunto.

 

Somos pautados, dominados, mandados e desmandados pelos meios de comunicação e suas opiniões. O público, no filme Mera coincidência, foi enganado pelo próprio governo e permaneceu na ignorância em relação ao assunto. Parte da história foi modificada e outra parte inventada.

 

Parar para pensar em algo tão complexo quanto o agenda setting me dá um nó na garganta. Até que ponto a história que eu conheço é do jeito que é? Quais foram os reais heróis e vilões das guerras (factuais ou não) apresentados nos livros?

 

O que aconteceu – ou deixou de acontecer – não importa. Importa tomarmos nossas próprias decisões baseados não no que a mídia pauta ou deixa de pautar, mas no que podemos perceber através dos tempos. A televisão, o rádio e o jornal não devem nos dizer o que fazer ou nos mostrar sobre o que comentar. A opinião deve ser própria. Redundante, mas funcional.

  
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